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Quem não planeja o futuro que quer deve aceitar o futuro que vier!


Em outubro a Ford publicou um relatório aguardado com ansiedade tanto pelos investidores quanto pelo mercado: o “CEO Strategic Update”¹. Esse é um documento importante pois sinaliza para os acionistas o rumo que a empresa pretende seguir na direção do futuro. Nos 6 pontos base do seu Plano Estratégico estão lições valiosas para as academias e os profissionais de fitness. Vamos a eles:

1. Cortar na carne. Reduzir dramaticamente a estrutura de custos.

2. Direcionar recursos para os produtos mais rentáveis. Investir apenas naquilo que gera vendas e dá retorno, i.e. caminhões e SUVs (bye-bye Ford Ka!).

3. Produzir na China para economizar (o futuro Focus será chinês).

4. Investir pesadamente em motores elétricos. A Ford vai reduzir em 30% o dinheiro destinado aos motores à combustão e canalizar esses recursos no desenvolvimento de motores elétricos.

5. Simplificar e modernizar. Existem 35.000 configurações diferentes na atual geração do Ford Fusion! Menos combinações e novas ferramentas de produção (robôs, impressão 3D e realidade virtual) ajudarão a Ford a ficar mais ágil e reduzir em 20% o custo do desenvolvimento de novos veículos.

6. Carros conectados como prioridade. 100% dos novos veículos da Ford nos EUA serão construídos com essa capacidade e 90% dos veículos da marca globalmente até 2020.

O que podemos extrair dessas diretrizes?

1. Você está passando por problemas e o dinheiro não é suficiente? Tem que cortar custos! Analise cuidadosamente o que é essencial e livre-se do que não é. Enxugue seus gastos. Isso é o que eu chamo de “estratégia da tesoura”. O problema: Não estamos acostumados a “descartar” e sim a “acumular”. Descartar dói e, no caso das empresas, também gera despesas. Mas talvez agora seja a hora de finalmente se livrar daquele professor cujas aulas caíram muito a audiência ou daquele que fica dependurado no teto do salão de musculação no horário de pico (o “homem morcego”).

2. Faça uma análise de Pareto (Princípio 80/20) e veja de onde de fato vem o seu dinheiro. E direcione seus esforços para isso. Isso significa que não é hora de tentar uma miríade de coisas e sim focar naquilo que é garantido que funciona! Em momentos de crise não se deve investir ou tentar promover atividades de baixa procura e baixa venda.

3. O que você pode substituir e gerar o mesmo resultado para o cliente com menor custo operacional? Precisa mesmo imprimir avaliação física? Não dá para gerar um PDF e enviar por e-mail? Analise a quantidade de professores por horário e veja se a demanda atual justifica essa quantidade. Caso contrário, ajuste a oferta à demanda.

4. Não adianta correr do futuro! O melhor é preparar-se e abraçá-lo na sua chegada. Assim como os motores à combustão, o fitness voltado para boa forma está sofrendo uma morte lenta e dolorosa. Eu já escrevi sobre a obsolescência do modelo de negócios das academias aqui, aqui e aqui. Não leu ainda? Vale a pena para sua própria sobrevivência.

5. Há uma coisa na psicologia da tomada de decisão chamada “decision fatigue”. Após um tempo envolvido num processo de análise e reflexão a qualidade das decisões tomadas por um indivíduo é bastante deteriorada². Em outras palavras, “pensar cansa”. Contrariamente ao senso comum, quanto maior a quantidade de opções oferecidas para um indivíduo menores as suas chances de comprar! Seu portfolio é extenso e composto por vários itens e combinações que não acabam mais? Simplifique e facilite a tomada de decisão do consumidor!

6. O neoconsumidor do século XXI é hiperconectado, social e multimídia. A internet da sua academia deve ser aberta ao cliente e com supervelocidade! Você precisa trabalhar as/com/nas redes sociais. Não há outra alternativa viável para aparecer no radar de atenção do consumidor!

Há exatos 10 anos a Ford anunciava seu Plano Estratégico para estancar 30 anos de uma lenta e gradual sangria que a estava conduzindo para fora do mercado, numa marcha inexorável para a obsolescência. Funcionou! O plano “One Ford” sanou as deficiências da montadora na época e a colocou de novo no trilho da competição. Entretanto, em apenas 10 anos, o cenário da competição mudou radicalmente e agora a Ford se vê de novo correndo atrás da sobrevivência no futuro. A empresa prepara uma transição para um momento em que ela não vai mais apenas construir carros, e sim transportar coisas e pessoas – como o Uber!

E você, consegue ter uma visão clara do futuro? Sabe para onde está indo o mercado de academias?

O que quase ninguém vê < ou reconhece > é que o produto “fitness” perdeu atratividade e não é mais tão “sedutor”. A maior evidência disso é que todas as semanas, em todos os lugares, algum proprietário decide colocar seu negócio à venda ou fechar as portas. A culpa não é da “competição predatória” ou das academias “low cost”. Esses caras são a alternativa mais barata e/ou conveniente para um consumidor calejado e farto de falsas promessas. Eles são o “Netflix” e as academias tradicionais as “TV a cabo”. Eles são o “Uber” e as academias tradicionais os “taxis”. Você já sabe quem o neoconsumidor vai preferir…

Enquanto isso, as DCNT lideram as causas de mortes prematuras (30 a 69 anos) no Brasil³ e o número de pessoas com diabetes, obesidade (adulto e infantil) e hipertensão atingem recordes históricos. Imenso problema, imenso market share! Só que a solução que as academias oferecem hoje ninguém quer. “Exercício” virou sinônimo de “obrigação”, “punição” e/ou “chatice”. Na Inglaterra 62% dos britânicos preferem morrer a ter que fazer exercícios!⁴. Tem alguma coisa muito errada no Reino do Fitness, pois ninguém quer ir para lá para se salvar…

A configuração dos serviços nas academias precisa de um “facelift”, uma virada total. Quem ainda acha que seu core business é “exercício” está sofrendo de Miopia de Marketing⁵. Ao traçar sua rota para o futuro, é fundamental ter uma visão de longo prazo e agir diligentemente para escapar do Buraco Negro da Obsolescência. O Plano Estratégico da Ford pode servir de referência, mas você precisa ter o seu. Quem não planeja o futuro que quer deve aceitar o futuro que vier.

Prof. Cleverson Costa

PhD Researcher

Lisbon School of Economics & Management

Universidade de Lisboa – Portugal

1. http://shareholder.ford.com/news-and-events/events/2017/10-03-17

2. Baumeister, R. F. (2003). The psychology of irrationality: Why people make foolish, self-defeating choices. In I. Brocas & J. Carillo (Eds.), The psychology of economic decisions, Volume 1: Rationality and well-being (pp. 3-16). Oxford, United Kingdom: Oxford University Press.

3. UK YouGov Survey, August 2007.

4. Malta, D. C. et al., (2017). Mortality due to noncommunicable diseases in Brazil, 1990 to 2015, according to estimates from the Global Burden of Disease study. Sao Paulo Medical Journal, 135(3), 213-221.

5. Levitt, T. (1960). Marketing Myopia. Harvard Business Review. 38 (4), 45-56.

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